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Fonte: IstoÉ Dinheiro – São Paulo/SP – ECONOMIA –

O movimento que levou o dólar a superar, pela primeira vez desde 2004, a barreira psicológica dos R$ 3,00 começou há pouco mais de um mês, na manhã da sexta-feira, 30 de janeiro. Durante um seminário realizado pelo Bradesco em São Paulo, o ministro da Fazenda, Joaquim Levy, disse a uma plateia de profissionais de mercado e empresários que não há intenção de se manter o câmbio artificialmente valorizado. Para ele, a responsabilidade do governo na busca pela competitividade é dar segurança às empresas e batalhar por uma redução de custos da porta da fábrica para fora.

Levy advertiu as empresas exportadoras que elas precisam ser mais competitivas, sem contar só com a ajuda do dólar. Mesmo assim, os comentários soaram como um alerta de que o Banco Central (BC) iria deixar as cotações oscilarem de acordo com a oferta e a demanda. Foi como dar comida ensanguentada aos tubarões do mercado financeiro, abrindo o apetite para uma danosa corrida cambial. O BC de Alexandre Tombini também alimentou os especuladores ao mudar, de repente, a política cambial. Na segunda-feira 2, indicou que, em abril, poderia reduzir a rolagem de swaps cambiais, que ajudavam a segurar o dólar e a reduzir a volatilidade.

Com isso, a moeda americana disparou e o dólar comercial fechou a R$ 3,01 na quinta-feira 5. Ao meio-dia da sexta-feira 6, estava em R$ 3.07, maior nível desde julho de 2004. A disparada do câmbio, depois de atravessar quase dois anos de relativo controle, traz dois problemas. O primeiro, mais sensível para as famílias, é a pressão sobre os preços. Cerca de 40% da cesta de consumo do brasileiro é vinculada ao dólar, e uma alta na taxa de câmbio pressiona os preços, diz o economista Luiz Carlos Mendonça de Barros, um ex-tubarão do mercado que hoje critica a atuação do BC.

A alta de 6,7% do dólar na primeira semana de março e de 15,6% no ano representa mais lenha na já escaldante fogueira da inflação. Se o dólar ficar nesse patamar até o fim do mês, isso terá representado um avanço de 0,9 ponto percentual nos índices de preços. Mais perigoso do que o dólar a três reais é uma inflação de dois dígitos, diz Mendonça de Barros. A inflação já passou de 8% e esse é um problema real. O segundo efeito danoso para a economia é o impacto negativo sobre as empresas. Dólar mais caro pode parecer um presente dos deuses para o empresário de qualquer setor produtivo, pois torna mais competitivos os produtos brasileiros e, simultaneamente, encarece a concorrência.

No entanto, isso só funciona para poucos setores. Na prática, a interligação das cadeias produtivas faz com que a alta do câmbio eleve os custos além do que seria suportável em uma economia desaquecida como a brasileira. Um bom exemplo é o setor automotivo. Segundo a Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), as exportações subiram 9,2% em fevereiro em relação ao mesmo mês de 2014. Mesmo exportando mais, a produção caiu 28,9% em relação ao ano passado. Teremos de revisar para baixo as projeções de produção para o ano, diz Luiz Moan, presidente da Anfavea, na quinta-feira 5.

Segundo ele, o câmbio mais caro eleva os custos dos insumos, aperta as margens e reduz as vendas. O exemplo dos pneus é didático. O setor enfrenta uma dura concorrência com os importados e, em tese, um câmbio mais alto reduz as desvantagens fiscais e as ineficiências da economia. Mas não é o que ocorre. Hoje, cerca de 70% dos nossos custos de produção são vinculados ao câmbio, porque muitos dos insumos são importados ou cotados em dólar, em especial a borracha sintética, diz Alberto Mayer, presidente da Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos (Anip).

Quando o dólar sobe, o pneu importado fica mais caro, mas essa vantagem é anulada pela alta de preços do produto nacional, diz ele. Para os analistas, não há, no curto prazo, sinais de redução na pressão de alta. Segundo Mendonça de Barros, o dólar precisa ser ancorado. Há um círculo vicioso, em que o dólar sobe, isso puxa a inflação, e obriga o BC a elevar os juros. Com isso, o apoio à presidente cai, a confiança no real se deteriora, favorecendo a corrida para o dólar, diz ele. Isso vira uma correia negativa da felicidade, e só tem uma pessoa que pode dar um murro na mesa e acabar com isso: o ministro da Fazenda.